jazzportugal.ua.pt
HOME CONTACTOS BUSCA SUBSCRIÇÃO
 
agenda
media
escritos e entrevistas
músicos
jazzlinks
  escritos  ::  entrevistas  ::  trabalhos alunos UA  ::  e mail e fax  ::  riff  ::  Jazz de A a ZZ

escritos e entrevistas > lista de escritos > ver artigo
Jazz nos Açores
14-09-2014
 

JAZZ NOS AÇORES

José Ribeiro Pinto

1. ANTECEDENTES

Pode-se dizer que até aos anos quarenta o jazz apenas era conhecido nos Açores através da rádio, dos discos e do cinema. Uma ou outra notícia aparecia nos jornais, mas, efectivamente, tratava-se de um género musical sem expressão nas ilhas.

A partir dos anos 40 com a chegada dos militares ingleses e americanos e a construção da Base das Lajes dá-se a verdadeira eclosão do Jazz na Ilha Terceira, que se começa a ouvir ao vivo pela primeira vez através de orquestras militares inglesas e de espectáculos realizados na Base por Glenn Miller, Frank Sinatra e Stan Kenton, ao mesmo tempo que chegava pela rádio, em filmes e nos muitos discos que começam a aparecer na Base e que rapidamente passam “para fora”, especialmente para Angra do Heroísmo. Daí resultou a constituição dos primeiros grupos portugueses a tocar jazz. Manuel Reis formou a primeira orquestra de jazz, composta por militares terceirenses. A extrema dificuldade sentida por estes para captar a essência rítmica do jazz levou, porém, ao seu despedimento e consequente desmembramento da orquestra, a qual seria refeita posteriormente, mas com outros músicos. O primeiro grande grupo que surge desta influência é, porém, a Olmmar Band. Formada em Angra do Heroísmo em Junho de 1946, esta banda já fazia incursões pelo Jazz, embora fosse essencialmente um grupo de baile que tocava rumbas e tangos, mas também Fox-trots e Dixieland.

Nos anos 50 o jazz foi tocado principalmente por quatro grupos terceirenses: Olmmar Band, AeroJazz, Orquestra de Art Carneiro e quarteto de Art Carneiro.

Nas restantes ilhas formaram-se naturalmente vários grupos musicais mas não tocavam jazz. Trataram-se de grupos de baile, alguns muito famosos até.

Pode-se dizer que os anos 50 foram autênticos anos loucos de jazz na Ilha Terceira. Para além dos muitos músicos norte americanos que passaram e tocaram na Base, os grupos citados tocavam semanalmente quer na cidade quer na Base Aérea.

Nos anos sessenta, com o advento dos novos ritmos e de grupos como os Beatles, os grupos de jazz foram desaparecendo. No entanto, surgiu o primeiro e mais importante grupo verdadeiramente de jazz dos Açores – o Flama Combo, um quinteto notável que chegou a tocar diariamente no Clube de Oficiais Americanos da Base das Lajes e era presença assídua nas emissões do Rádio Clube de Angra. O grupo tocou em várias ilhas dos Açores, na Madeira e em Lisboa.         

Nos anos setenta e quase todos os anos 80 praticamente deixou-se de ouvir jazz ao vivo na Terceira. Só em 1986 é que a Câmara Municipal de Angra do Heroísmo constitui uma Comissão de Assuntos Culturais a qual até 1990 organizou vários concertos de jazz: Sexteto de Jazz de Lisboa, Sexteto de António Pinho Vargas, The Fringe de George Garzone, Mário Laginha & Pedro Burmester, Maria João & Aki Takase, Quarteto de Carlos Martins, Moreiras Jazztet.

Em Maio realiza-se o primeiro Festival de Jazz nos Açores - o “Jazz Sons de uma Longa História” na Praia da Vitória, Ilha Terceira, onde entre outros estiveram Betty Carter, Maria João & Mário Laginha, The Fringe, alguns grupos locais e a Original Pinstripe Dixieland Brass Band. Este festival teve um sucesso extraordinário.

Nos anos seguintes ocorrem na Ilha Terceira concertos de Wallace Roney, Lew Soloff, Hermeto Pascoal, Airto Moreira e Flora Purim e Ahmad Jamal, entre outros.

 

2. SITUAÇÃO ACTUAL

2.1 – FESTIVAIS

Os acontecimentos atrás descritos – especialmente o “Jazz Sons de uma Longa História” - aliados ao extraordinário acontecimento que foram os primeiros Festivais de Jazz de Cascais, aos quais assistiram muitos açorianos que estavam a estudar no Continente, criaram a necessidade da realização de um festival de jazz anual com a maior projecção e credibilidade possíveis. Assim nasceu em 1999 o Angrajazz – Festival Internacional de Jazz de Angra do Heroísmo. O Festival nasce por convite do Secretário Regional da Economia do Governo Regional dos Açores e do Presidente da Câmara Municipal de Angra do Heroísmo, o que evidencia a consciência que havia de que o gosto pelo Jazz estava muito mais desenvolvido na Terceira do que nas outras Ilhas.

Este facto é importante, pois no mesmo ano nasce na Ilha de S. Miguel o Festival Jazzores sem os mesmos apoios institucionais.

 

2.1.1 - ANGRAJAZZ

O festival ANGRAJAZZ assumiu-se desde a primeira edição como um acontecimento com os seguintes objectivos fundamentais:

  • Um Festival de grande qualidade, susceptível de vir a constituir um marco no panorama musical anual dos Açores e da Terceira em particular;

  • Ser conhecido para além das fronteiras da Região, inserido no calendário anual dos Festivais de Jazz em Portugal;

  • Contribuir para o desenvolvimento do gosto pelo Jazz.

    A caminho da sua 16.ª edição, que se realizará nos próximos dias 2, 3 e 4 de Outubro, pelo palco do Angrajazz já passaram alguns dos maiores músicos do Jazz, como John Scofield, Toots Thielemans, Frank Morgan, Kenny Barron, Cedar Walton, Steve Turre, Martial Solal, Regina Carter, Birelli Lagrene, E.S.T.. Wycliffe Gordon, Sheila Jordan, Dave Holland, Preservation Hall Jazz Band, Joe Lovano, Enrico Rava, Enrico Pieranunzi, Benny Golson, Jim Hall, Monk’s Casino, Tom Harrel, William Parker, Herbie Hancock, Henri Texier, Charles Lloyd, Mingus Dinasty, Steve Swallow, Kurt Elling, Dave Douglas, Tomasz Stanko, Jack DeJohnette, Jason Moran, Carla Bley, Fred Hersch, Cécile McLorin Salvant, entre muitos outros. Muitos dos músicos portugueses já estiveram no festival – Carlos Martins, Paula Oliveira, Mário Laginha, Zé Eduardo, João Moreira, Bernardo Moreira, Afonso Pais, Mário Barreiros, Hugo Alves, Luis Cunha, Rui Teixeira, Orquestra do Hot Clube de Portugal, Orquestra de Jazz de Matozinhos, Laurent Filipe, etc.. Este ano estarão Joey DeFrancesco, Barry Harris (concerto n.º 100 do festival) Gary Smulyan, Ricardo Toscano e René Marie, para além da Orquestra Angrajazz.

    2.1.2 – JAZZORES

    O festival JAZZORES realiza-se na ilha de S. Miguel e assume-se desde a primeira hora como divulgador de uma música improvisada, criativa e intuitiva, de liberdade e vanguarda. “Nós, desde o início, não fomos pelo caminho do que tradicionalmente se chama Jazz, mas sim pelo caminho de uma música actual como forma de arte que ultrapassa o Jazz de Museu”, explica Damião Melo um dos organizadores

    É uma organização da Jazzores, em co-produção com o Teatro Micaelense, que continua a explorar os caminhos mais alternativos do jazz.

    Nas suas 15 edições realizadas até agora passaram músicos como Joe Lovano, Paul Motian Electric Bebop Band, Dave Douglas, Jason Moran, Naldo’s Jazz Family, James Blood Ulmer, James Carter, Charles Gayle, Michael Wimberly, Dr Lonnie Smith, Robert Glasper, William Parker, Mostly Other People Do The Killing, Lee Konitz, David S. Ware, Jonathan Batiste, Hamid Drake, Jacinta, Cooper-Moore, Henry Grimes, Joachim Kühn, Marty Ehrlich, Demian Richardson, John Blum, Daniel Carter, Septeto do Hot Clube de Portugal, Brad Mehldau, Milford Graves, Evan Parker, Wadada Leo Smith, Thollem McDonas, Raymond King, Florian Weber, Ursula Oppens, Maya Homburger e Barry Guy entre outros.

    De notar que nos últimos anos o Festival levou alguns concertos dos seus músicos contratados a outra ilhas como Santa Maria, Graciosa e Faial.

     

    2.1.3 – +JAZZ

    O Projeto "+ Jazz" nasceu em Janeiro de 2012. “É um projecto assumidamente generalista e tem como principal objectivo divulgar e estimular a criação artística na área do Jazz nos Açores. E a difusão de jovens artistas Açorianos ou artistas a residir nos Açores.

    O conceito Chill Out surge neste contexto fazendo a ligação do ambiente à música oferecendo ao espectador uma experiência de relaxamento total.

    O projeto “+ JAZZ & Chill Out Session’s” inclui acções multidisciplinares que vão desde a música, cinema, artes plásticas, literatura, fotografia e artesanato.

    Conceito jovem e inovador pretende ser um centro de atracção onde se partilhem experiências criativas e sensitivas entre pessoas, de diferentes gerações, com desejo de dar e receber, e criar um elo de ligação entre todas as vertentes culturais entre ilhas.

    Objetivos:

    -Concepção, planeamento e produção de eventos (sociais, formativos, de turismo e animação sociocultural, entre outros).

    - Ser uma plataforma a nível local e regional de promoção e divulgação de artistas regionais.

    - Promover as tendências e a cultura urbana.

    - E naturalmente, divulgar o gosto pelo Jazz”;

    Realizou 3 “festivais” com debates e músicos locais nem sempre muito jazzísticos, mas com a vantagem de os promover.

    2.2 – RÁDIO

    A principal estação divulgadora de jazz nos últimos 25 anos tem sido a rádio pública – RDP, ANTENA 1 – AÇORES. António Melo Sousa tem sido um grande divulgador quer através de programas específicos quer no preenchimento de momentos da programação quer como incentivador/”professor” de colegas mais jovens. Destes destaca-se claramente Elsa Soares que o substituiu na cobertura do Angrajazz e que a partir dessa altura divulga o jazz quer avulsamente em períodos da emissão quer em programas específicos como Avenida Marginal, quer especialmente, nos últimos seis anos, Saltos Altos, no qual as mulheres têm a primazia mas não o exclusivo.

    Em 1988, José Gaspar Ferreira e José Ribeiro Pinto realizaram um programa maioritariamente de jazz na então “rádio pirata” Rádio Horizonte. O programa terminou aquando do processo de atribuição de frequências de rádio.

    Desde Fevereiro de 1992 José Ribeiro Pinto realiza na estação pública o programa “Os Sabores do Jazz”, o qual é hoje o programa mais antigo da rádio nos Açores e vai já com mais de 1270 emissões.

    A Rádio Lajes – a rádio da Força Aérea nos Açores - ao longo dos anos tem divulgado muito avulsamente o jazz. Nos anos 90 João Pedro Montalverne e Eduardo Reis realizaram nesta estação durante meia dúzia de meses um programa de jazz semanal. Actualmente transmite jazz com regularidade e acompanha os principais eventos.

    O Rádio Clube de Angra transmite desde Maio de 2013 o programa +Jazz que é, segundo a sua realizadora, Daniela Silveira “um programa direccionado para os amantes de jazz e sonoridades chill out, dando espaço à escuta de novos talentos nacionais e internacionais do jazz e da fusão do jazz com outros géneros musicais como o hip hop, funk, soul, rock entre outros”.

    Produção e apresentação do programa +JAZZ todas as sextas-feiras (23h - 24h) e sábados (21h - 22h). 

     

    2.3 - MÚSICOS

     

    Como resultado do atrás descrito, nos últimos 25 anos têm aparecido alguns músicos que procuram tocar Jazz. Saliento como mais importantes o Trio Fragata com Susana Coelho e o Quarta Essência, ambos terceirenses e de vida efémera no início dos anos 90, o Only Jazz Quartet, formado em Ponta Delgada por Jorge Lima, um guitarrista terceirense, contava com Christian Alexander no trompete, Michael Ross no contrabaixo e o continental João Silvestre – bateria o qual teve uma actividade assinalável durante alguns anos, tendo participado nos festivais Angrajazz e Jazzores e animado muitas noites micaelenses.

    Também Michael Smith, músico americano a viver há alguns anos em S. Miguel, tem tocado em diversas ocasiões com o já referido Michael Ross e outros músicos que “aparecem” como Michael Wimberly, por exemplo. O mesmo tem procurado fazer Michael Ross.

    Fruto do Angrajazz, em 2002 formou-se a Orquestra Angrajazz, dirigida por Claus Nymark e Pedro Moreira e constituída por jovens músicos oriundos das Filarmónicas locais e do Conservatório de Angra do Heroísmo. A orquestra assume-se desde o início como um projecto de Formação que tem vindo a evoluir. Participa anualmente no festival Angrajazz, onde já tocou com os seus convidados Paula Oliveira (gravou o seu 1.º Cd com ela), Mário Laginha, Zé Eduardo, Afonso Pais, Mário Barreiros, Hugo Alves, Luís Cunha e Manuel Linhares, e nas festas Sanjoaninas, para além de muitos outros concertos na Terceira, noutras ilhas açorianas, na Madeira e em Lisboa. A qualidade da orquestra tem levado a que receba convites de vários quadrantes, alguna inesperados , como foi o caso do convite para abrilhantar a tourada comemorativa dos 25 anos da praça de touros da Ilha Terceira (claro que tratou-se de tocar passo dobles, mas o seu sucesso foi notável),

    Como se esperava, ao fim de dez anos de actividade, a Orquestra Angrajazz começou a dar os seus frutos. Liderado pela sua pianista, Antonella Barletta, surgiu o quinteto “Wave Jazz Ensemble” grupo que tem tocado mais ou menos regularmente nos últimos 18 meses. A mesma pianista tem animado outras formações (trios, quartetos) que se vão apresentando em diversas ocasiões nos mais variados sítios.

     

    Em Rabo de Peixe, Illha de S. Miguel nasceu há vários anos a Orquestra Oi Jazz. A Escola de Música de Rabo de Peixe, actualmente com cerca de 150 alunos, foi criada em 2001, por iniciativa da Presidência do Governo Regional dos Açores. Com sede no Cine-Teatro Miramar, integra, desde 2006, o Serviço Educativo do Teatro Micaelense. Pioneira como projecto de música pela inclusão, por dedicar-se maioritariamente ao jazz, ao longo destes 11 anos, tem vindo a crescer e a afirmar-se, sendo uma mais-valia para a comunidade em que se insere.

    A Orquestra Oi Jazz , que é dirigida pelo professor Carlos Mendes conta com músicos com idades que vão dos dez aos vinte e poucos anos, tem o apoio de Paula Oliveira, Pedro Moreira e Claus Nymark e constitui um projecto notável de inclusão da juventude numa vila que já foi considerada uma das  mais pobres da União Europeia.

     

    2.4 – CLUBES, BARES, ETC.

    Não existe nos Açores nenhum Clube de Jazz, para além das Associações Culturais Angrajazz e Jazzores.

    A Associação Cultural Angrajazz dinamiza e apoia a Orquestra Angrajazz.

    A Associação Cultural Jazzores apenas organiza o festival Jazzores.

    Na segunda metade dos anos 80 abriu na Ilha Terceira o Bar de Jazz de Eduardo Reis o qual, embora sem ter música ao vivo, praticamente só passava jazz. O bar permaneceu aberto até 2013.

    Alguns bares na ilha organizam muito ocasionalmente sessões de jazz ao vivo com os grupos locais já referidos.

    Em S. Miguel também têm existido alguns bares onde se pode ouvir e até tocar Jazz, destacando-se, actualmente o Colégio 27, propriedade do músico já Michael Smith, acima referido.

     

    2.5 – ESCOLA

    Não há dúvida que, com a divulgação que tem sido feita ao longo dos últimos anos, o Jazz ganhou um estatuto de certa importância que de algum modo começa a ter repercussão na comunidade.

    Os festivais existentes sempre procuraram divulgar o jazz junto das escolas.

    O caso mais importante é o já citado projecto que tem sido desenvolvido na vila de Rabo de Peixe.

    Interessante, também, é o facto da Escola Básica e Secundária Tomás de Borba, que integrou o Conservatório da Angra do Heroísmo, nos últimos anos terminar o seu ano lectivo com um concerto de jazz “Jazz na Escola” no qual apenas participam alunos e professores.

    Fixada nos seus objectivos a Associação Cultural Angrajazz levou a efeito, no ano lectivo de 2013-2014 com o apoio da Escola Básica e Secundária Tomás de Borba e da Direcção Regional da Cultura o primeiro Curso Livre de Jazz, o qual contou com a frequência até final de 15 alunos.

    De facto este curso aparece como um complemento fundamental ao trabalho desenvolvido ao longo de anos no âmbito das actividades da Orquestra Angrajazz, permitindo incidir mais trabalho de improvisação, repertório e fundamentos teóricos e históricos para o desenvolvimento deste estilo.

    O curso foi dirigido por Claus Nymark com a vice-direcção de Pedro Moreira e contou com os professores Gonçalo Marques, Pedro Felgar e André Carvalho, para além dos professores da Escola Antonella Barletta, Paulo Borges, Edgar Marques e Antero Ávila.

     

    Do que acima ficou escrito podemos concluir que o Jazz é altamente respeitado e tem tido um desenvolvimento apreciável nos Açores. Naturalmente, a pequena dimensão da Região e a distância a que se encontra, quer do Continente português quer dos outros centros, leva a que qualquer realização tenha custos muito mais elevados que em qualquer outro lado, tornando difícil a ocorrência de mais eventos com os músicos nacionais e estrangeiros.

     

Fonte: Jazz na Terceira, João Moreira dos Santos & António Rúbio – Edição Bluedições; Produção
José Ribeiro Pinto
 
  Escritos e entrevistas  
 
   
Festivais  
 
   
Universidade de Aveiro
© 2006 UA | Desenvolvido por CEMED
 VEJA TAMBÉM... 
 José Duarte - Dados Biográficos