José Duarte - deixa que o chamem pianista jazz? Júlio Resende - Sim, com prazer! Para mim é como se me chamassem "português", ainda que neste caso tenha sido eu quem decidiu a sua "nacionalidade", em vez do acaso. JD - que diferença faz um pianista jazz de outro pianista? JR - A língua. O pianista de Jazz fala uma língua diferente do pianista de outro "país". Mas convém dizer que o Jazz é uma língua com uma enorme abertura por excelência a todas as boas influências externas. JD - o que precisa de cumprir um pianista jazz para ser bem cotado? JR - Depois de se aprender falar "Jazz" quem sai por cima é que souber fazer Poesia com as palavras do "Jazz". JD - é considerado o melhor pianista jazz português da geração mais recente - comentários JR - Não sabia isso! Não posso dizer que não fico contente por o meu trabalho ter recebido esse reconhecimento, mas como dizia alguém "há sempre alguém melhor que tu!" Por isso, toca a trabalhar (risos) JD - domina a linguagem bebop? JR - Não, mas todos os dias procuro conhecê-las mais e melhor. JD - seus mestres internacionais JR - Ouvi e oiço muitos... comecei pelo Michel Petrucciani e o Bill Evans e entretanto fui tendo muitos outros. JD - segue artistas como Cecil Taylor? JR - Não. Conheço, mas não sigo. JD - diz-se que todos os pianistas jazz contemporâneos têm influências de Bill Evans e/ou Keith Jarrett - comentários JR - É díficil estudar o piano jazz e não ficar abismado com a beleza da poesia desses senhores. Sim, sou fã! JD - com quem já gravou? JR -Para além do meu disco "Da alma" , participo no último disco do Carlos Martins "Água". JD - tem dificuldades em solar em improvisar? JR - Dificuldades tenho muitas (risos) ... mas ainda assim adoro fazê-lo pois é quando me sinto mais autêntico. JD - consta que o notável pianista jazz Erroll Garner não 'sabia Música' - acha possível? o Conservatório é necessário? JR - Sim, é possível. Saber música não é necessário (mas ajuda), o conservatório não é necessário (mas ajuda) JD - solo(s) de outro(s) pianista(s) que muito considere JR - Há muitos..., por exemplo, Bill Evans "Spartacus Love theme", Bernardo Sassetti "drume negrita" (num disco do Perico Sambeat), entre muitos outros JD - prepara seus solos improvisados? JR - Não e Sim! Como é óbvio não tenho nada anteriormente escrito quando vou solar, mas é claro que o meu trabalho diário pretende antecipadamente preparar-me o mais possível para esse momento, ainda que de modo ambíguo se procure também na improvisação a libertação a fuga daquilo que te é "antecipado". JD - o melhor swingman que conhece - Tommy Flanagan? JR -Keith Jarrett. JD - usa usou usará teclado ligado à corrente eléctrica? vantagens? inconvenientes? JR - Uso. Tenho um projecto com o João Paulo que se chama "Happenning" em que toco também teclado. São outras possibilidades que te são oferecidas e que de vez em quando sabem muito bem. (risos) JD - para exemplos Ornette e Rollins têm discografias onde o piano não existe - qual o futuro dos instrumentos acústicos na linguagem musical jazz? JR - Felizmente acho que os instrumentos acústicos ainda têm muito para dar ao Jazz. JD - quais as características fundamentais para um discurso musical ser chamado jazz? JR - Para mim, há certas idiossincrasias rítmicas e melódicas que revelam se a pessoa é um habitante do país do Jazz. Mas dizer exactamente "o quê" é complicado agora aqui. JD - o público para jazz em Portugal conhece jazz? JR - Felizmente o acesso à informação é neste momento muito fácil, logo acho que as pessoas já vão conhecendo muito mais e melhor sobre Jazz. Agora, ainda continua a ser uma música entendida de modo mais profundo por pouca gente. JD - gostaria de tocar em 'Jazz em Agosto' festival da Gulbenkian? JR - Claro! Seria uma honra tocar num Festival por onde já passaram tantos e tão excelentes músicos! JD - das largas dezenas de festivais jazz de Portugal em quais já tocou? JR - Depois do lançamento do disco tenho tocado em mais em Festivais, como o de Loulé ou Sines, Coimbra... JD - prefere tocar com voz com sopros ou em piano trio? porquê? JR - Neste momento é ainda com sopros que me sinto melhor. Porque gosto muito da voz dos sopros! JD - há dificuldades extra para um pianista jazz com cultura europeia ocidental tocar blues' JR - Não, se entendermos o" blues" como "melancolia", como eu o entendo. JD - seu repertório - standards? temas originais? JR - O meu repertório de concerto são normalmente originais, mas adoro tocar standards também, sobretudo porque incitam sempre a que se tente tocar o mesmo de forma diferente, para "Jazzear" JD - será fácil ser um jovem e bom pianista jazz em Manhattan? JR - Duvido. Estamos a falar de um local com muitos, muitos, muitos e bons músicos. Por isso se quiseres viver da música não deve ser fácil, mas para crescer deve ser muito bom! JD - muito obrigado Júlio Resende JR - Obrigado eu caro José Duarte! |