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Baldo Martinez
01-01-2008 00:00
 

 

Baldo Martinez 

À guitarra, trompetes e saxofones junta-se a 'zanfona', um instrumento de cordas que vibram impulsionadas por uma manivela que faz girar uma roda. São curiosidades do CD intitulado 'Projecto Miño', do contrabaixista Baldo Martinez, que há dias tocou no Bragajazz.  Sai ainda em Abril, sob chancela da discográfica espanhola Karonte; inclui temas como 'Suite do Miño', 'Marcha de Guimarães', 'De Norte a Sur', 'Canta a Rula' e 'A Riveira'. Maite Dono (voz), António Bravo (guitarra), Carlos Castro (percussão e vibrafone), Pedro Lopes (bateria), David Herrington (trompete), Chaki Mawatari (tuba), Alejandro Perez (saxofones e clarinete) e German Diaz (sanfona) completam o elenco.
No Festival, onde Baldo Martinez tocou no ano de 1999,  dia 17 de Novembro, com um ensemble que acompanhou a cantora  Maria João, o organizador do Guimarãesjazz, Ivo Martins, encomendara-lhe um projecto baseado na música popular do Norte de Portugal e da Galiza.


"Eu sou galego, pensaram que eu era a pessoa adequada par faze-lo, dentro da linguagem do jazz contemporâneo que eu faço", explica-nos Baldo Martinez, horas antes de actuar no Bragajazz, com o quinteto em que apresentou o seu mais recente CD, 'Tusitala', um título que invoca histórias viagens, pois Tusitala chamavam nas ilhas do Pacífico ao lendário escritor Robert Louis Stevenson, autor da celebérrima 'Ilha do Tesouro'.


- O Projecto Miño destina-se a um público popular ou requer formação musical?
- Há músicas que tens que estar preparado para ouvi-la. Requer esforço se a escutas pela primeira vez. Mas penso que a música, se transmite algo, transmite-o a qualquer um. Se não transmite nada, não comunica com ninguém. É música popular, não no sentido em que seja mais comercial.

- Mas é acessível?
- É primitiva.

- Pode-se identificar? As pessoas do Norte de Portugal e da Galiza que escutem o disco vão reconhecer sons que são das suas tradições?
- Eu penso que sim. Mas é uma faca de dois gumes. Eu não espero ver povo a dançar com esta música.

- Mas pode dançar-se?
- Sim, pode. Tem ritmo. Há um tema muito central que é popular na zona de Trás-os-Montes. Chama-se 'A Riveira'. As músicas populares não têm fronteiras. Isso acontece com a pandeirada da Galiza. A partir da música popular tentamos chegar a âmbitos mais contemporâneos. Há músicas populares que são sempre identificadas. Mas eu uso uma linguagem improvisada. Procuro desenvolver, por novos caminhos.

- O que escutaste ao fazer a pesquisa para o Projecto Miño?
- Procurei música popular, do Norte de Portugal e da Galiza. Escutei músicas diversas mas escolhi aquelas que me dizem a mim algo. Que me valiam como ponto de partida. Também fiz composições completamente novas, a partir do zero. Há temas populares que são arranjados por mim e composições minhas, mas baseadas nesses ambientes populares, de origens anónimas, cujo autor não é conhecido. 'A Riveira' é um tema popular de raízes localizadas em Trás-os-Montes. O tema 'Canta a Rula' é de origem árabe. Há uma composição minha que se chama 'De Norte a Sur', na qual procuro demonstrar de alguma maneira que as fronteiras na música não existem. E que tanto no Norte como no Sul podes escutar as mesmas músicas. No Norte, mais identificada pela cultura celta, no sul mais influenciada pela música árabe. Mas no sul também podes encontrar músicas de raiz escandinava.

- Até que ponto o disco pode interessar ao público em Portugal?
- Se o disco tem por referência o país, lógico que há gente que se interessa. O projecto não é uma ideia basicamente minha. Foi uma proposta da organização do Guimarãesjazz que encaixa perfeitamente na minha forma de tocar. Quando fazemos música é importante que haja gente que a escute. Penso que em Portugal e na Galiza as pessoas vão reconhecer o disco.

- Antes deste projecto, o Baldo Martinez já é considerado no contexto do jazz espanhol como um caso à parte. Criou um caminho próprio. Não se confunde com a mainstream. Isso resulta de não se identificar com a música que já se conhece, ou mais da necessidade de criar algo novo?
- Eu comecei a tocar rock, tocava baixo eléctrico. Depois uns anos tocava contrabaixo e baixo eléctrico, até que escolhi o contrabaixo como instrumento para a minha música.

- Que corrente do jazz mais o seduziu inicialmente? O bebop, o cool, o free?
- Quando começas a tocar um novo género, tens de começar pelo princípio da história. Eu comecei com muitos músicos da minha geração em Espanha que vínhamos do rock. Entrámos no jazz pelo jazz-rock dos Weather Report, Jaco Pastorius Chick Corea nas correntes mais eléctricas. Sâo referências que abrem as portas para outros músicos, descobri o Bill Evans e outros mais clássicos, o bebop. o cool., o free jazz, o Ian Garbarek dos anos 70.

- A etiqueta ECM...
- Sim. A ECM sempre me atraiu mais a atenção dentro da música jazz. Depois tens o jazz americano, apela tivo e muito rico. Mas também tens a necessidade de demonstrar o que tens.

- Há alguma influência da paisagem, geográfica, cultural e humana que
te rodeia? circunstâncias que não as mesmas dos músicos americanos?
-  Na época em que vivemos, a cultura que nós temos pode ser em muitos casos similar à cultura italiana, latina, mediterrânica. mas também pode ser semelhante à alemã. Estamos a viver numa sociedade globalizada, embora a sociedade americana tenha particularidades em relação à europeia. Mas estás sempre a viver com o ambiente que tens.
Há uma série de histórias que estás a viver, distintas das que se vivem em Nova Iorque ou em Berlim. Eu senti-me excessivamente colonizado por uma música que não era minha, embora me pudesse parecer atractiva. Sentia também que a música se tinha desenvolvido de uma maneira que eu também poderia desenvolver, mas por outro lado. Porque há sempre alguém que faça melhor do que tu. Pensei: que faço eu fazendo o mesmo que fazia Charlie Parker? Aprender. Mas depois como artista tenho necessidade de dar um passo adiante. Se o Charlie Parker não tivesse dado um passo adiante, estavamos muitos passos atrás. Se Louis Armstrong não tivesse dado um passo adiante, estavamos ainda mais atrás. Não estou a querer comparar-me com eles, mas como artista quero marcar as pautas, buscando uma linguagem. Procurei correntes mais abertas. Não só a ECM mas também algum free jazz. Mas não desprezo os elementos que caracterizam o jazz norte-americano, o swing, mas como feeling, não como ritmo. Tentei arranjar outros ritmos, evitar de uma maneira premeditada essa influência. No final está a dar resultados com os quais estou satisfeito mas ainda não terminei. Continuo a ter como referências outros  músicos europeus.

- Como por exemplo...
- Por exemplo Louis Sclavis, francês. É um dos mais interessantes. Em Itália Pino Minafra, que já tocou em Braga. Há muitos mais. Mas  são estéticas distintas. O Louis Sclavis diz que não faz jazz. Eu creio que é para sacudir a pressão do o que é jazz e o que não é jazz. Mas ele está influenciado pela música contemporânea europeia, pelo jazz, que ele conhece bem e por todas as músicas que lhe interessam.

- No Baldo Martinez essas opções ocorrem de forma calculada ou
simplesmente acontecem de modo natural e espontâneo?
- No meu caso faço isso de forma deliberada, mas tento que seja algo intuitivo, natural. Mas o que se passa é que para sair natural tens que o incorporar de alguma maneira. Tens que ter um processo.
- De procura anterior?
- Exactamente. Tens que ir procurando aqui e acolá. Depois vais expor de uma forma natural. A grande diferença, como eu falava ontem com um companheiro. É que no jazz americano há uma série de estruturas e de fórmulas que se empregam. Permaneceram ali e não as largam Podem fazer pequenas mudanças, que podem parecer mudanças grandíssimas, mas com as mesmas fórmulas. No caso da Europa o que se está a passar é que não existem fórmulas pré-estabelecidas. Há algumas. Se as queres tomá-las - mas se não as queres procuras outras. Mas não se trata de buscar o distinto só por ser original.

- Nem é falta de respeito pelos cânones?
- Não quero embandeirar, dizendo que como faço algo distinto está muito bem. Eu busco outra coisa dentro da música.

- Também escutas musica antiga?
- Sim, posso ouvir canto gregoriano. Não sei se foi o Duke Ellington quem disse isto: não há estilos de música. Só há boa e má música. A mim tentam colocar o selo de música de vanguarda. Não quero escutar músicas convencionais ou antigas. Se considerar vanguarda o que está mais adiante, está bem. Mas também na música também não podes ir mais adiante se não conheceres o passado.

entrevista conduzida por Rui Serapicos


 
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