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Emília Susana
04-02-2013 00:00
 

José Duarte - uma mulher a usar um instrumento de sopro é facto não muito vulgar em jazz - assim cumo se explica a si própria trompetista jazz?

 

Emília Susana - os instrumentos de sopro aparecem duma forma muito natural lá em casa... é que o meu avô tocou saxofone... foi ele que me ensinou as primeiras notas de música aos 8 anos comecei a tocar requinta na Banda de Torres Vedras (clarinete pequeno porque não tinha dedos para mais...) Tocar, tocar, tocar Cresci assim O aperfeiçoar do instrumento numa extensão do conservatório em Torres fez com que aos 15 anos de idade tivesse 0 8.º grau o clarinete cresceu comigo e portanto tudo dava um prazer enorme sentir que a coisa fluía sem pensar muito Só que aos 18 anos tive uma acidente grave e fiquei sem um braço... não dava para tocar mais? nem pensar tive muitos amigos a ajudarem-me a encontrar soluções..junto dos amigos da banda e da família era tudo mais fácil em Sta Cruz, no "Manel Bar", toda a gente se juntava para tocar uns standards de jazz com o Manel eram noites a tocar "Garota de Ipanema", "All of me", "Fly me to the moon".., ouvir Armstrong, Dizzy, Miles... começou tudo a fazer sentido... mas lembro-me até de gostar bastante mais de pianistas adorava Bill Evans.. mas foi o Tomás,..o Tomás Pimentel (estou a falar de 1995..) lembro-me dele e dum pianista a acompanharem a Eugénia Melo e Castro.. Né Ladeiras.. (não sei... uma cantora da moda da altura..) que me fez parar estupefacta a ouvir o seu fliscorne... lindo fiquei doida que som magnífico que melodioso que podia soar o "monte de lata" afinal mas por essa altura no "Manel Bar" há uma conversa duns amigos que tocavam na big band "Lisbon Swingers" e diziam-me: "oh Emília aparece lá num ensaio.." ganhei coragem... e fui depois quando dei por mim, uns anos depois estava a tocar um dos meus temas favoritos do disco do Tomás - "Três uma vez" (um tema do António Pinto) na "Reunion Big Jazz Band"... é incrível... mas... porque sou trompetista de jazz? o Claus Nymark foi ele que me puxou sempre para a frente leva-me para orquestra dos alunos do Hot Clube, e sempre que era preciso um trompete nas orquestras que dirigia lembrava-se de mim acho que o facto de ler me ajudou mesmo com todas as limitações enquanto trompetista mas os amigos músicos não desistirem de me acarinhar tem sido muito importante para ainda hoje tocar obrigado a todos (aproveito a oportunidade desta entrevista para o fazer... obrigado Fernando Soares por não desistires de mim..)   

JD - quando ou se tiver descendência direta aconselha futura vida cumo a de artista jazz? por ou para quê?

 

ES - tenho um filhote com 15 meses e só não toquei enquanto grávida porque não podia fazer esforços... com muita pena minha... mas agora está muito habituado a trompetadas há pouco tempo fartámo-nos de rir porque foi para o piano, com uma mão soprava num instrumento de plástico, com a outra batia nas teclas e ainda sapateava.. o verdadeiro artista do musical(ih ih ih...) Bem... a resposta é, claro está,  que ele será o que quiser não vou forçar nada...

 

JD - há quanto tempo toca jazz? foi de um dia para o outro?

 

ES - Não foi dum dia para o outro...  foi acontecendo... quando dei por mim com partituras à frente que conhecia como clarinetista e que conseguia ler mas não conseguia tocar no trompete... irritava-me tanto tocar numa big band foi muito bom (nunca o tinha feito com o clarinete) E quando pensava que não conseguiria fazer nada com o trompete o jazz curou a minha ressaca musical digamos assim... com toda a dificuldade que tinha em fazê-lo soar a vontade de tocar aqueles temas era tanta que não podia desistir ainda hoje é assim tem de soar ainda sofro um bocado porque nunca soa como quero... lá está tenho a leitura mas queria tanto ter mais tempo para me dedicar ao instrumento... às escalas..aos exercícios... a tudo o que mata qualquer vizinho mas que depois leva a dominar o instrumento, fundamental para o improviso como tenho um trabalho que me obriga a ficar pelo menos 7 h diárias em frente dum computador... não consigo dedicar-me ao instrumento como queria... consigo fazer uma grande ginástica para estudar os temas da orquestra Para que depois possam soar ainda há pouco tempo falávamos antes dum concerto que às tantas é bom para quem assiste achar que tocar um instrumento é coisa fácil é bom que pareça fácil é sinal que se trabalhou bem Há muita gente que me pergunta porque não improviso... porque não tenho nada escrito... a resposta é fácil: não trabalho o suficiente pode ser que um dia dê...    

 

JD - aprendeu jazz no convívio com outros instrumentistas ou na escola? acha que se aprende com a prática?

 

ES -Tudo o que sei aprendi com os outros instrumentistas... aprendi com todos os músicos com quem toquei Continuo a aprender com quem toco E é tocar, tocar, tocar claro e de preferência todos os géneros musicais É muito enriquecedor tive a sorte de poder participar em projectos que vão desde a banda de rua que tocava em cima duma carroça puxada a cavalos ("Bandinha dos Cavalos"), em que não se podia parar de tocar (aí trabalhava-se a resistência que também é importante) até a uma banda mais criativa ("Yemanjazz") onde tinha de tirar outros sons do trompete (até sons de passarinhos..) Depois..passar pelo casino uma temporada a tocar funk / soul foi bom... aquele balanço todo dava-me um gozo E até a experiência no hip-hop Aí tive mesmo de inventar umas malhas para o disco e foi uma aventura Todas estas experiências fazem evoluir E umas dão para as outras

 

JD - foi paixão ao primeiro som ou houve algum piano no meio?

 

ES - Houve piano na minha formação clássica (3 anos de teclado) Foi importante para visualizar a música... não sei dizer isto de outra forma e depois como disse logo no início desta entrevista, os pianistas de jazz até aparecem primeiro que os outros instrumentistas...quando comecei a tocar jazz tenho ideia de ter ficado deliciada com um disco do Mário Laginha, "Hoje"...

 

JD - os primeiros trompetistas que ouviu e a seguir os outros e os seus favoritos?

 

ES - Os primeiros são os óbvios como já tinha referido - o Armstrong, Dizzy Gillespie, Miles, Freddie Hubbard,.. Mas por força dos discos clássicos do Wynton... era o trompetista que ouvia mais quando ainda estava longe de saber que algum dia viria a tocar trompete Engraçado que agora que penso nisso também dos primeiros temas que consegui tocar no trompete foi dum disco em que ele toca com o pai Já cumprimentei o Wynton quando passou pelo CCB - estava tão atrapalhada Disseram-lhe que era trompetista e ele fez questão de me vir dar um aperto de mão - uns dedos finíssimos e compridos.. .incríveis... Mas.... a bem da verdade o the special one sempre foi o Clifford Brown Ainda hoje quando calha uma jam entre amigos o que sai é o "Sandu" ou o "Joy Spring"... Depois Kenny Wheeler (também tive o privilégio do ouvir ao vivo...) E um tema em especial - "Consolation" E por causa desse tema fui ter a um disco da Ingrid Jensen.. e podia ir por aí fora... Ah O Kenny Dorham... que fraseado Faz tanto sentido Também o Lee Morgan... aquele que a mulher se passou.. Ah ainda "vivinho da silva": e quem fui ouvir este ano e amei - o Enrico Rava, claro

Mas de facto foi aquele dia em que ouvi o Tomás e o seu fliscorne que me marcou.. 

 

JD - e músicos jazz femininos entre eles quais as que prefere? porquê?

 

ES - Ingrid Jensen... por causa do tema "Consolation" do Kenny Wheeler... e depois tenho seguido a Susana Santos Silva som limpo cristalino óptimo fraseado.. agora com os seus próprios projectos para além da OJM, espectacular Mas.. de todas as figuras do jazz feminino, a mais marcante sem dúvida é a Maria Schneider - dou por mim a cantarolar tantos temas dos discos dela... quando comprei o "Alegresse" há um tema que me faz voar o "Hang Gliding" .. com um solo de fliscorne de morrer... depois vi-a a dirigir na Culturgest músicos portugueses.. como é que a beleza e a firmeza podem estar juntas quando passou pelo CCB, a Ingrid vei-o com a orquestra da Maria.. mas não me impressionou muito nessa noite..   

 

JD - é uma mulher com swing e que improvisa?

 

ES - Improviso muito limitado... mas acho que tenho swing

 

JD - com quem trabalhou e hoje trabalha?

 

ES - Johannes Krieger, músico, amigo é o actual responsável pela direcção da Reunion Big Jazz Band, e nessa medida o "meu responsável" também (ih ih ih...) Sempre me ajudou Deu-me muitas dicas, passou-me muitas ideias e tirou-me muitos macaquinhos do sótão.. talvez seja ele que me meta a solar...

 

JD - jazz para si é só trabalho?

 

ES - não se fosse aliás já nem tocava... mas também nunca o encararei como lazer Muito embora tenha 7 h diárias noutra profissão nunca andaria na música como um hobby... isso é uma impossibilidade - se não for para trabalhar, na base do anda lá "bufar" umas coisas... digo logo que não Se não for para cumprir com os mínimos admissíveis não toco... nesse sentido é trabalho Mas é trabalho que dá muito prazer..

 

JD - cumo instrumentista mulher jazz qual é a sua opinião sobre as novas vozes jazz e a mais antiga Maria João?

 

ES - Sempre fui fã da Maria João acho que muitos puristas não gostam por ela ter experimentado outras coisas dentro do jazz mas aprecio isso gritar, soprar, gargarejar,  o que for... fazer o que lhe apetece com a voz desde que soe bem E para mim soa De qualquer forma jazz vocal não é propriamente uma coisa que me prenda... a Maria Schneider introduz muitas vezes a voz nos seus temas.. como se fosse mais um instrumento de sopro... gosto disso Depois há com certeza vozes que marcaram claro: a Elis Regina ela com o Hermeto Pascoal... puf... impressionante

 

JD - que lhe parece o minimundo jazz em Portugal no que respeita a possibilidades para tocar ou sítios para o fazer?

 

ES - acho que cresceu e ainda tem tendência a crescer mais a avaliar pela qualidade dos novos músicos portugueses os sítios para tocar, os festivais, os concertos de jazz são cada vez mais em cada vez mais sítios, e isso é bom Ganha-se é cada vez menos e por isso os novos talentos têm de reinventar formas de produzir as suas coisas... como colocar online... porque não há dinheiro para fazer o disco... mas felizmente que não desistem e com muito trabalho eles aparecem E é tão bom ouvir bons discos de amigos como ouvi este ano do Ricardo Pinto, Desidério Lázaro, Nuno Costa, Lars Arens, Sónia Cabrita,..

 

JD - conhece a discografia de Clark Terry e Dave Douglas ou Roy Eldridge até Marsalis o Winton? sua opinião

 

ES - discos do Marsalis desde o clássico ao jazz na realidade tenho discos de todos / ou com todos.. o Roy Eldridge já o ouvia quando ouvia Benny Goodman.. swing muita técnica mas tenho o Clark Terry mais presente, por tudo o que aprecio num trompetista: muito melodioso, e lá está, o som de fliscorne inigualável Mas...nesta fase.. muito Dave Douglas Sigo o trabalho dele com atenção Fui vê-lo com o Lovano ao Estoril Jazz... muito bom andei durante muito tempo agarrada ao "Mountain Passages" - o projecto Nomad pela sua essência, por todo o simbolismo... sonoridades que transportam para outros sítios... no carro tenho o projecto de dixieland e depois há o projecto Keystone que ele faz numa mistura de jazz com electrónica para banda sonora de filmes - o melhor do Douglas é o ecletismo Não oiço só jazz - gosto de punk rock, indie... sou militante de festivais do género... enfim...

 

 JD - fluegel ou trompete? quando? porquê?

 

ES - difícil... adoro fliscorne..tenho poucas oportunidades para tocar fluegel.. mas sempre que é oportuno..

 

JD - para o comércio já gravou? cumo saiu?

 

ES - bem... já gravei... hip-hop tuga (ih ih ih...) comércio online... e para uma peça de teatro que passou depois pelo CCB.. curiosamente não gravei para o disco que a Reunion está agora a lançar e da qual faço parte faz 10 anos coisas do destino.. 

 

JD - treina capacidade torácica? pratica a técnica ‘respirar sem parar'? serão estas duas capacidades úteis para um bom solo?

 

ES - usar o diafragma para controlar a respiração é a base de qualquer instrumento de sopro..

 

JD - gravar fotografar trai sua essência de Música improvisada de Música que nunca para?

 

ES - não parará por estar gravada aliás, acho que o facto é que a manterá viva Se não fossem as gravações que chegaram até aos nossos dias como seria? quem improvisa fará dela sempre o que quiser - terá sempre liberdade para isso E depois... uma fotografia também nunca é igual a outra      

 

JD - e uma atuação em solo puro? gostaria de experimentar?

 

ES - não... nem me daria gozo... para mim a música só faz sentido com os músicos

 

JD - prefere tocar com muitos ou com poucos? porquê?

 

ES - lá está desde que não seja sozinha depois não é o número - se tiver a tocar em duo, que seja, já há fio condutor.. já é bom Mas com muitos dá um gozo o ouvido fica regalado (ih ih ih...) 

 

JD - quais os palcos onde já tocou em Porto e ou Lisboa?

 

ES - S. Luiz, Hot, Onda Jazz, Ritz, Maxime, Instituto Franco-Português, Casino de Lisboa e Estoril (Salão Preto e Prata), Pavilhão Atlântico... e no Porto - sempre que fui ao Porto foi para tocar no Palácio da Bolsa.

 

JD - Obrigado Emília Susana

 


 
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