José Duarte - morada sua em Portugal e na Austria - para quê? André Carvalho - Actualmente estudo em Viena por isso tenho uma morada Austríaca. No entanto, vou com regularidade a Lisboa, cidade onde sempre vivi. Por isso faz todo o sentido ter as duas moradas. Além disso é sempre bom estar contactável. JD - pode ouver-se seu jazz na net - via que links? AC - Tenho o meu site pessoal: http://www.andrecarvalhobass.com/ Tenho também um site ( http://andrecarvalhoquintet.bandcamp.com/ ) onde está disponível para audição e compra do disco que gravei recentemente com o meu quinteto e que estará nas lojas mais semana menos semana. Deste mesmo quinteto, tenho também uma página no Facebook: http://www.facebook.com/andrecarvalhoquintet JD - nasceu em 81 ano na qual em Portugal se vivia quase a mesma cena de hoje mas bem diferente da dos anos 70 - opinião AC - Bem, não sei se será bem assim, talvez nalgumas coisas, noutras sem dúvida que não. Não tenho, por razões óbvias, a experiência de vida nos anos 70 e nos 80 era demasiado pequeno para ter noção, mas julgo que a situação que se vivia nessas décadas era diferente da de hoje. Hoje há mais sítios para tocar (ainda não os suficientes), mais festivais, mais escolas e sem dúvida muitos mais músicos. Sinto que nos últimos anos a cena Jazzistica cresceu imenso. JD - usa cbaixo acústico exclusivamente ou também toca baixo? porquê? AC - Começei por tocar baixo eléctrico. Foi o meu primeiro contacto com um instrumento musical. Toquei baixo eléctrico durante pouco tempo porque rapidamente me apaixonei pelo contrabaixo. Actualmente toco exclusivamente contrabaixo apesar de ter alguma vontade de pegar novamente no baixo. Mas sinto que é, sem dúvida alguma, que é com o contrabaixo que me mais identifico e é este instrumento que mais gozo me da tocar. JD - vive só com euros via jazz ou utiliza também seu Curso de Informática da FCUL? AC - Vivo apenas de tocar contrabaixo. Estudei e conclui a licenciatura em Informática na Faculdade de Ciência já há alguns anos. Nunca cheguei, no entanto, a trabalhar nessa área. O último ano da licenciatura na FCUL, correspondeu também ao ano em que comecei a tocar e estudar contrabaixo. Foi um ano complicado, com imensas coisas para fazer, ter de acabar o curso e uma vontade muito grande de estudar e tocar contrabaixo. Felizmente tudo correu bem e desde então foquei toda a minha atenção na música. Mas obviamente que, num mundo cada vez mais voltado para as tecnologias, a licenciatura de informática acaba por ser sempre útil e uma ferramenta à mão. JD - em relação a cbaixistas acústicos jazz a cena portuguesa jazz hoje tem qualidade? quais instrumentistas gostaria de destacar? AC - Sem dúvida que tem qualidade e o nível tem subido cada vez mais, o que é óptimo! Que instrumentistas gostaria de destacar? É sempre uma pergunta que pode suscitar alguma controvérsia por eventualmente me esquecer de citar alguém mas, à parte dos contrabaixistas que já têm uma longa e firmada carreira, como o Bernardo Moreira, Carlos Bica, Carlos Barretto, Zé Eduardo, Nelson Cascais, Mário Franco e Damien Cabaud, há, julgo eu, uma nova geração de contrabaixistas que tem imensas qualidades como os meus amigos e companheiros do "Rabecão" João Hasselberg, António Quintino, Francisco Brito, André Rosinha, Gonçalo Leonardo. JD - aprendeu muito jazz na escola do HCP ou foi ajudado pelos conhecimentos que obteve quando estudou Música de Câmara? AC - Acho que aprendi muito sobre música tanto no HCP como nos outros sítios onde estudei música de câmara ou dito de uma forma ainda mais abrangente música clássica. Sem dúvida que, o HCP foi uma escola muito importante para mim, onde tive um contacto muito grande com Jazz e com muitos dos músicos nacionais que tanto admiro e com quem tive o prazer de ter aulas e de aprender o máximo possível. Mas sinto que por estudar também música clássica, ganhei uma outra perspectiva. Acabei por conhecer e experimentar outras abordagens à música que considero enriquecedoras. Basicamente tentei ir buscar a estes dois universos o que acho mais interessante e importante, não só como formação, mas também para linguagem musical. JD - descreva experiência certamente obtida nas frequências de workshops jazz e a que se obtem em workshop que não se obtenha em masterdlasses ou escolas AC - São diferentes maneiras de aprender. Diria que nas escolas a aprendizagem resulta da regularidade das aulas enquanto nos workshops as coisas acontecem num curto espaço de tempo e talvez de uma forma mais intensa visto que o contacto com as pessoas ou professores é maior. São ambas óptimas maneiras de estar em contacto com músicos e nenhuma delas deve ser menosprezada. JD - conhece o tocar de Jimmy Blanton? e de Scott LaFaro? AC - Sim, conheço ambos. Curiosamente tive contacto primeiro com o Scott LaFaro. Aliás, o primeiro cd de Jazz com que fiquei completamente fascinado foi a última gravação com o Scott LaFaro, antes de ter tido o trágico acidente que teve. Morreu muito novo mas esse último disco, com o trio do Bill Evans, Sunday at Village Vanguard, é um dos meus preferidos. É um contrabaixista que muito admiro e que gosto de ouvir tanto com o Bill Evans como também com outros músicos como Ornette Coleman. Em relação a Jimmy Blanton, "conheci-o" mais tarde. Sempre gostei muito de tocar em Big Band, tanto repertório mais tradicional como também mais moderno. Por isso, o Jimmy foi sempre um contrabaixista que gostei de ouvir e conhecer. Além disso, foi um contrabaixista completamente inovador no seu tempo. As linhas e solos com arco são sem dúvida algo para ser estudado! JD - se possível distinga o que separa jazz n-americano de jazz europeu? AC - Julgo que hoje em dia, com as distâncias cada vez mais encurtadas, a Internet, a grande quantidade cd's, a facilidade com que se pode gravar, etc as coisas acabam por estar mais misturadas e as diferenças são menores. No entanto, o Jazz feito nos Estados Unidos é naturalmente diferente do feito na Europa, nem que seja pelo factor geográfico e por ter sido nos Estados Unidos que tudo começou. Mas há apesar de tudo, óptimos músicos de Jazz em ambos os sítios. JD - cite quem o premiou quando e porquê AC - Sem dúvida que o prémio mais importante que ganhei até hoje foi o prémio de "Best Group" no Concurso Internacional de Jazz de Bucareste em Maio deste ano (2011). Foi um prémio atribuído ao meu quinteto. Tivemos o apoio do Ministério da Cultura e da Embaixada de Portugal na Roménia, a quem muito agradeço a ajuda que, sem esta, muito dificilmente teríamos podido participar no concurso. Ganhei também um prémio de reconhecimento na Festa do Jazz no São Luiz, representando o HCP e a Academia de Amadores de Música. JD - que lhe parece a divulgação em Portugal via imprensa escrita falada e por tv AC - Julgo que é ainda insuficiente. Deveria haver muito mais divulgação tanto escrita como falada e TV. Há por vezes concertos em que o grupo que se apresenta é formado por excelentes músicos, toca musica muito bem escrita e interpretada e o público não corresponde em termos quantitativos. Não sei de quem será a culpa, se os organizadores, se dos Media se por falta de dinheiro. No entanto, a divulgação é essencial para que a música chegue às pessoas. JD - tem facilidade de tocar com músicos portugueses em Lisboa ou Porto? e com músicos estrangeiros? AC - Sem querer dizer um cliché, mas dizendo-o na mesma, "A música é uma linguagem universal". Por isso julgo que à partida a facilidade será a mesma. No entanto, é natural que me entenda melhor com as pessoas que têm a mesma abordagem musical que tenho, mas julgo que isto é um assunto que pode tem a ver com questões geográficas. JD - descreva cd «Hajime» que gravou para a etiqueta TOAP publicado neste 2011 AC - "Hajime" é o meu primeiro disco. Há cerca de 2 anos formei o meu quinteto com o Zé Maria (saxofone), Bruno Santos (guitarra), Filipe Melo (piano, Rhodes e melodica) e João Rijo (bateria). Foi com este grupo que gravei para a TOAP e contei com a participação especial da Mariana Norton (voz) numa das faixas. Desde a altura em que formei o grupo começei a escrever música original. Sempre tive um interesse muito grande por composição e foi óptimo poder escrever para esta formação e para estes meus companheiros musicais. A música que gravei foi toda escrita por mim e eu diria que é fruto das minhas influências e percurso musical. É, talvez, um cd que incorpora vários universos diferentes, como o Jazz, música clássica, musica contemporânea, rock e uma "pitada" de música portuguesa.O disco estará nas lojas mais semana menos semana e teremos um concerto especial de lançamento em Lisboa na Fundação Portuguesa para as Comunicações dia 21 de Setembro. Este concerto terá o apoio e transmissão directa pela Antena2 e contarei com a participação, mais uma vez da Mariana Norton e também do quarteto de cordas Tempus, para o qual escrevi em conjunto com o Filipe Melo, especialmente para este concerto, dois arranjos de dois dos temas que estão presentes no disco. JD - está satisfeito com sua sonoridade em cbaixo? e a de Ray Brown? AC - Julgo que é uma questão que nunca estamos satisfeitos, nem mesmo o Ray Brown que tinha um super som! De certeza que ele tentou sempre ter melhor som, estudando e melhorando a sua sonoridade. É um dos pontos que tento melhorar e que faz parte da minha prática de estudo diário. JD- sola sempre à vontade? prepara seus solos? como? AC - Gosto muito de improvisação por isso é mais um dos pontos que tento estudar diariamente para, no momento em que tenho de "solar", me sentir à vontade. Se preparo solos? Não, mas obviamente que há sempre recursos que qualquer músico de Jazz tem na manga e que são fruto de horas de estudo. No entanto, é sempre bom evitar os recursos mesmo que sejam os nossos próprios para não cairmos numa "rotina". JD - Zé Eduardo disse-me que Paul Chambers foi o melhor - concorda? AC - Se foi o melhor não sei, talvez isso seja uma questão de gosto pessoal. Mas que foi sem dúvida alguma um dos melhores, foi! É um dos meus preferidos! Sempre gostei muito de o ouvir e continuo a ouvi-lo e a estudá-lo. JD - quantos cbaixos tem? porquê? AC - Tenho apenas um contrabaixo. Infelizmente, não basta querer ter um bom contrabaixo porque se assim fosse teria uma casa cheia deles! Os contrabaixos são caros e um bom ainda mais. JD - blues é uma linguagem musical diferente de todas as outras? porquê? AC - Sim, é uma linguagem diferente, com uma história muito interessante e fruto de muitas circunstâncias. JD - solos gravados em cbaixo que mais aprecia? porquê? AC - Todo um conjunto de factores, som, tempo, fraseado, articulação, expressividade, criatividade etc. Gosto de ouvir contrabaixistas muito diferentes uns dos outros, tanto em termos de época como de abordagem musical. Cada um com ideias muito próprias. JD - sua opinião sobre Esperanza Spalding? AC - Conheço alguns trabalhos do seu grupo e vi um concerto dela no ano passado em Viena. É uma contrabaixista interessante e que canta muito bem. É sempre acompanhada por músicos de altíssima qualidade como por exemplo o Leo Genovese. Não é, no entanto, o estilo de Jazz feito actualmente que mais aprecio. JD - será importante ter expressão sonora com balanço com swing na formação musical de um jazzman contemporâneo? AC - Talvez não seja essencial, mas para mim faz todo o sentido conhecer a tradição desta musica, os músicos que ajudaram a criar esta linguagem e a sua história, mesmo que o tipo de Jazz que se faça não seja tradicional. Na minha perspectiva, é o mesmo que estudar literatura portuguesa, sem saber quem é Camões. Eventualmente alguém consegue fazê-lo, no entanto, há um vazio enorme por não o conhecer. Além disso, é sempre bom conhecer várias abordagens e perceber como chegámos à música que temos hoje. JD - o que distingue jazz das outras Música? AC - É uma pergunta difícil de responder e hoje em dia é cada vez mais difícil de definir Jazz. Não basta dizer que é uma música com uma forte componente de improvisação, visto que há muitas outras músicas que tem a improvisação como algo essencial. Será no entanto, importante referi-lo. Talvez outro ponto importante será a facilidade ou melhor, a universalidade da própria linguagem. Por exemplo, dois músicos de Jazz de sítios totalmente distintos, sem nunca terem tocado juntos e sem terem algo preparado podem facilmente tocar juntos e soar bem! Algo que não acontece com muitas outras linguagens. JD - porque é que jazz não é Música comercial não agrada à maioria de quem o ouve ? AC - Julgo que o que se passa no Jazz é algo que se passa com qualquer outro tipo de música, ou seja, há correntes mais "comerciais" e outras mais "underground". Por exemplo, no rock/pop há correntes mais comerciais e outras muito mais vanguardistas, experimentais, alternativas, etc. Há correntes de Jazz digamos que mais "fáceis" de ouvir ou mais facilmente compreensíveis do que outras que requerem um pouco de "devoção" ou "dedicação". Mas de uma forma geral, julgo que o Jazz sempre foi uma música marginal que vai estando, periodicamente, na moda. JD - obrigado André Carvalho |